Por: Thiago Fernandes
Fonte: Conjur
A promulgação da Emenda Constitucional nº 132 e da Lei Complementar nº 214 representa uma mudança de paradigma fundamental no nosso sistema tributário sobre o consumo. Um dos pilares centrais dessa reforma é a adoção do princípio do destino, que define que a receita do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência compartilhada entre estados, Distrito Federal e municípios, será atribuída ao ente federativo onde ocorre o consumo do bem ou serviço.
Historicamente, nosso sistema tributário, especialmente o ICMS e o ISS, estava frequentemente atrelado à origem da produção ou prestação. Isso fomentou a guerra fiscal, onde municípios e estados competiam para atrair empresas, muitas vezes concedendo benefícios fiscais, na esperança de aumentar a arrecadação direta baseada em onde a empresa estava localizada ou iniciava a operação.
Com a reforma, essa lógica se altera significativamente. O incentivo para atrair empresas deixa de ser primariamente fiscal sob a ótica da arrecadação do IBS/CBS relacionada à origem. A receita do IBS passará a ser direcionada para onde o consumidor final se encontra.
Isso impõe um novo desafio aos gestores municipais e pode demandar uma reorientação nas estratégias de gestão e desenvolvimento local. Se antes o foco era atrair fábricas e empresas geradoras de empregos com base em incentivos fiscais de origem, agora o foco precisará se deslocar para a atração e retenção de pessoas (residentes) e atividades que gerem consumo local [consequência do princípio do destino]. O “poder de compra” dos cidadãos que vivem ou consomem em um município específico passará a ter um impacto direto e transparente na sua arrecadação de IBS.
Alguns críticos levantam a preocupação de que municípios com menor base populacional ou pouca atratividade para o consumo possam enfrentar dificuldades, o que, em uma visão mais drástica, poderia até suscitar debates sobre a necessidade de fusões municipais (esta última, uma inferência não diretamente detalhada como consequência inevitável nas fontes, que, ao contrário, preveem mecanismos de distribuição e compensação para preservar a receita dos entes federativos durante a transição e no novo modelo).
O Comitê Gestor do IBS, composto paritariamente por representantes de estados e municípios, terá justamente a função de gerir a arrecadação e distribuí-la com base nas regras, incluindo o destino.
Ainda assim, a necessidade de adaptação na gestão municipal parece clara. Prefeitos terão que repensar como tornar suas cidades mais atrativas para que as pessoas que consomem escolham estar nelas, seja através da melhoria da qualidade de vida, infraestrutura, serviços públicos ou fomento a atividades que estimulem o comércio e o consumo local.
Esta é, sem dúvida, uma das transformações mais impactantes da reforma tributária no pacto federativo e na forma como o desenvolvimento municipal será pensado no Brasil nos próximos anos.